Sanctuarium MARUBO

 


MARUBO
Classificação linguística: Pano
População: 1.252 (Funasa – 2006)
Local: Amazonas

Eles estão em contato com a sociedade nacional desde 1870 e foram incorporados ao trabalho de exploração da borracha.  O homem pode se casar com várias mulheres (poligamia), e cada uma delas ocupa um espaço bem definido na maloca. 



Por influência dos missionários, hoje, os mortos são sepultados em cemitérios, mas a cremação fazia parte dos antigos costumes desses índios, eles comiam as cinzas com mingau para que o morto pudesse continuar entre eles.

A única exceção ocorre com as crianças de colo, que são enterradas geralmente entre as árvores. É uma população de 600 pessoas, que falam a língua da família Pano e vivem ao longo dos rios Ituí e Curuçá, na Amazônia, junto à fronteira com o Peru.


É pela mitologia que os Marúbo descrevem o Universo e contam como se formou. De um modo geral, os seres são sempre feitos de partes de outros seres, a começar pela superfície terrestre, composta de partes moles dos corpos de animais mortos, enrijecidas pelos seus ossos. 

Também a água dos rios e os seus peixes são feitos a partir de outros seres, bem como os vegetais da floresta. Do mesmo modo surgiram as plantas cultivadas, segundo um dos três diferentes mitos que contam sua origem. 

O Universo se compõe de várias camadas, as superiores chamadas céus e as inferiores, terras. É na terra que está acima das demais, a da Névoa, que vivem os seres humanos.

Os humanos têm várias almas, que, entretanto, podem resumir-se a duas: a da direita ou do coração e a da esquerda. 


Após a morte, a última fica vagando por esta camada, mas a outra é encaminhada para o Caminho da Névoa (Vei Vai), que percorre, passando por muitas provas ou perigos, aos quais não pode sucumbir, sob pena de aí ficar para sempre, até chegar ao lugar onde vivem as almas de membros de sua seção.

 

Aí tem sua pele trocada por Roka (macaco parauacu), e passa a uma vida farta, saudável e feliz. O termo que designa o céu onde se faz essa troca é o mesmo aplicado ao parente a quem se dá o nome: Shokó.



Os Marubo surgiram do chão, cada seção de um buraco diferente, estimulada por algo que acontecia na superfície: queda de folhas, penas, pingos de seiva. Isso aconteceu junto ao estuário mitológico aonde vão ter as águas dos rios que conhecem.


Daí foram subindo ao lado do rio, até chegarem à região onde hoje vivem. Ao longo desse percurso foram aprendendo sua cultura: qual a pupunha comestível, qual a secreção de perereca mais apropriada para eliminar a preguiça e o panema, como ter relações sexuais, a proibição do incesto, os termos de parentesco, a maneira adulta de chorar, as plantas cultiváveis, os cânticos de cura, os nomes pessoais. 

No início os vivos podiam ir e vir por um caminho chamado Yové Vai até o Shoko Nai. Porém, uma mulher maltratada pelo marido conseguiu de certos espíritos o fechamento desse caminho e a abertura do Vei Vai. Isso acabou separando definitivamente os humanos comuns dos espíritos Yové.


RITOS...

Aqueles donos de maloca que granjearam prestígio pelo seu modo de agir comedido e pacífico, que promovem festas e a paz e são procurados como conselheiros merecem o título de kakáya.

Talvez os ritos menos formais e freqüentes sejam as refeições e as festas de beber, para as quais uma maloca convida os vizinhos, quando há de carne de caça de sobra ou macaxeira, milho ou pupunha disponíveis. 

Mais elaborada e mais rara é a festa Tanaméa, em que a maloca anfitriã limpa os caminhos até as malocas convidadas, e abre algumas clareiras para nelas receber com bebida os convidados que se aproximam. 

A entrada destes na maloca anfitriã é agressiva, escavando o pátio externo e destruindo as palhas das paredes. Em compensação, os moradores da maloca podem tomar dos convidados os enfeites que trazem.

Anualmente se realiza em cada maloca a festa da colheita do milho, em que a aplicação de urtigas ou de picadas de tocandeira nos homens e as brincadeiras que imitam as diferentes fases da atividade venatória de modo a propiciar os resultados da caçada coletiva predominam sobre boa parte do rito.


O transporte de novo trocano desde a mata, onde foi confeccionado, até o interior da maloca constitui também uma ocasião ritual. O pesado instrumento é amarrado ao centro de um longo tronco, cujas extremidades os homens colocam aos ombros. 

Os carregadores, apoiados em bastões, além de terem de andar pelo caminho escorregadio, enlameado pelas chuvas, devem suportar também as cócegas que lhes fazem as mulheres que os classificam como maridos.

No que tange ao ciclo de vida, o rito mais visível é o funerário, que no passado envolvia a cremação, a pulverização dos ossos e sua ingestão pelos parentes dentro de um alimento pastoso, seguido do desfile com partes do corpo do morto no sentido de ajudar a sua "alma do coração" a encontrar o caminho das provas post-mortem. 

Atualmente, o cadáver é envolvido na sua rede e levado pelas pessoas que mantém com o defunto as relações mais distantes para o cemitério, bem afastado da maloca, onde é depositado numa sepultura, sobre a qual se constrói um pequeno tapiri.


Os ritos que mais freqüentemente se realizam estão no âmbito da magia e se apresentam sob duas formas: os cânticos de cura e as sessões xamânicas.

Qualquer homem maduro se sente na obrigação de entoar os primeiros, sentado com outros em banquinhos em torno da rede do doente, quando este é um parente próximo. 

Mas há reconhecidos especialistas nesses cânticos, os kenchintxô ou "curadores". São cânticos que duram pelo menos quarenta e cinco minutos, repetidos ou substituídos por outros a intervalos pelo número de vezes que a gravidade do mal o exigir.

Antes de cantar pela primeira vez e nos intervalos, os curadores bebem Ayahuasca e tomam rapé. Têm uma seqüência padronizada: uma introdução narra como se formou o espírito da doença, constituído de partes de diferentes seres; uma narrativa de como a doença entrou no enfermo; a invocação de seres e qualidades que entram no corpo do enfermo para combatê-la, entre os quais tem papel preponderante o espírito feminino Shoma; e a recuperação do doente. 

Uma outra maneira de entoar cânticos de curar é sobre um pote de mingau cujo conteúdo será depois consumido por aqueles que desejam os efeitos esperados. Também sobre um pote é possível entoar cânticos maléficos, sendo o conteúdo aplicado secretamente na pessoa que se deseja enfeitiçar.

Freqüentes também são as sessões xamânicas, mas somente nas malocas onde vivem um dos poucos Xamãs Marúbo (na década dos oitenta não passavam de três), chamados Romeyá ou "Pajés". 


O xamã, quando vai atuar, começa a tomar rapé e Ayahuasca a partir das sete horas da noite, junto com os homens que constituem a assistência, todos sentados nos compridos bancos da entrada da maloca. 

Por volta das onze horas da noite, o xamã, agora numa rede pendurada junto à porta, recebe o primeiro espírito; e assim vai recebendo sucessivamente outros espíritos até por volta das cinco da manhã, quando termina a atividade. Cada espírito que o xamã recebe utiliza-se do corpo deste para falar, conversar, dançar.


Enquanto isso ocorre, a alma do xamã visita a maloca onde vive o espírito, depois que caminhar por um dos vários caminhos cósmicos. 

A sessão xamânica não tem um fim meramente de curar doentes ou achar coisas perdidas, como alguns espíritos se dispõem a fazer. 

É um ato de comunhão com seres de caráter benevolente, os Yové, de outras camadas do cosmos, que gratifica, apóia, ensina e até diverte os homens que estão junto ao xamã, e as mulheres e crianças, que o escutam de suas redes.